Fonte – revista Wired.
Chris Anderson, editor-chefe da revista Wired, Usa, publicou um longo artigo intitulado “The Long Tail”.
“The Long Tail” é bem mais que um simples texto, é uma bela tese sobre a importância dos mercados de nicho e como a internet colaborou para que eles fossem valorizados e tornassem a estar em evidência.
Seus efeitos começam a surgir, alertando indústrias variadas para determinados modelos econômicos e financeiros que têm na Amazon.com seu melhor exemplo.
A expressão “The Long Tail”, ou Cauda Longa em português sincero, é amplamente utilizada no vocabulário dos estatísticos e serve para apontar distribuições de dados onde o volume diminui ao longo do tempo.
O fenômeno também é corriqueiro no mercado de bens de consumo.
Assim, seus gráficos no estilo XY ilustram grandes procuras por um minúsculo grupo de produtos bem como demandas irrisórias por um considerável conjunto de produtos.
A forma resultante desses dados num gráfico é bastante similar à cauda comprida de um animal qualquer. Daí, evidentemente, o nome.Há anos seria complicado justificar o investimento em mercados pequenos em função de uma série de custos fixos como manutenção de estoques, catálogos, além daqueles atribuídos à distribuição.
Mas criaram a Internet e nela não faltam particularidades até então bastante raras, como ausência de estoque e até mesmo o surgimento de produtos e serviços meramente virtuais, digitais. Tais características mandaram para o espaço mais uma batelada, igualando a importância de produtos muito procurados à de outros que podem estar entregues às moscas.
Resumindo: a rede viabilizou a Cauda Longa, fazendo com que os incontáveis produtos que têm pouca saída tenham uma importância comercial igual ao dos mais vendidos.
Em seu artigo, Anderson ilustra a força da Cauda Longa a partir do caso do livro “Touching the Void”, lançado em 1988 pelo alpinista Joe Simpson.
Apesar de bem aceito pela crítica, ele na época não teve êxito nas vendas.
Uma década depois, outro autor, Jon Krakauer, publicou “Into The Air”, emplacando um grande sucesso com a mesma temática: tragédias no alpinismo.
Imediatamente a procura por “Touching the Void” voltou, tendo uma nova edição produzida às pressas com o intuito de alimentar o mercado.
Leitores passaram a promovê-lo junto com “Into Thin Air”, aumentando ainda mais a sua procura. Em pouco tempo o título figurava na relação dos mais vendidos do “New York Times”.
No mesmo mês foi lançado, também, um documentário que o tinha como inspiração.
Em pouco tempo “Touching the Void” vendia mais que o dobro de “Into Thin Air”. De modo simplificado, o sucesso do caso acima deve-se às recomendações da Amazon.com.
Isto porque seu sistema enxergou padrões no comportamento dos compradores e sugeriu que quem tinha gostado de “Into Thin Air” também gostaria de “Touching the Void”.
Os consumidores confiaram no palpite, compraram o produto indicado e retornaram ao site para publicar críticas recheadas de satisfação.
Tal guinada nas vendas impactou em mais recomendações e um novo ciclo desse processo envolvendo consumo e feedbacks.
A afirmação de Chris Anderson de que há alguns anos esse cruzamento de interesses não seria factível faz todo o sentido.
Mais complicado ainda é negar que a Amazon tenha sido a responsável pelo impulso dado a “Touching the Void” combinando seu espantoso acervo de livros com a informação em tempo real sobre tendências de compra e opinião pública.
Coisas da internet.
Paira no ar a idéia de que esta é uma forma mais espontânea e maleável de tendência de consumo, para a qual as indústrias do entretenimento e da mídia já começam a dedicar seus olhares famintos. E sobram motivos consistentes para isso.
Afinal, a irrestrita oferta de produtos e serviços online permite que o consumidor não tenha um comportamento massificado, indo atrás daquilo de que realmente gosta.
Como bem diz Anderson: “As pessoas estão pesquisando fundo no catálogo, ao longo da extensa lista de títulos disponíveis, o que é muito mais do que se pode encontrar na Blockbuster, Tower Records e Barnes & Noble.
E, quanto mais encontram, mais gostam.
À medida que se afastam do caminho tradicional, descobrem que suas preferências não são tão populares como pensavam (ou como tinham sido levadas a acreditar pela publicidade, falta de alternativas e uma cultura movida por sucessos).
(…) Enquanto a indústria do entretenimento do século XX era baseada em sucessos, a do século XXI será igualmente baseada em quase fracassos”.
Faz sentido.
O primeiro ponto-chave para que a Cauda Longa seja vista em toda a sua plenitude encontra-se na disponibilidade dos produtos.
Logo, ainda que o público para determinado produto seja ínfimo, indica-se oferecer esse material na rede – justamente o contrário do que é praticado atualmente, onde, em geral, a demanda acaba guiando a oferta.
O segundo está no preço do que é oferecido, que deve ser acessível, principalmente se este for um bem digital, como músicas para download, por exemplo.
Por fim, é importante oferecer ao consumidor os dois lados da moeda, não somente os campeões de venda, nem apenas aquilo que um único sujeito ousaria experimentar.
Quanto mais ampla a gama de produtos, maior a chance do consumidor ir se embrenhando, conhecendo e comprando materiais novos.Não há razão para visar apenas os filões – até porque raros são os espaços para novos competidores. Nichos não faltam, estão cada vez mais em evidência com o surgimento de tantas tendências, novidades e especializações.
E sábio é aquele que sabe como tratá-los. Tudo indica, mesmo, que estamos numa nova fase do consumo. Mais democrática, permissiva e integrada. Não há como chegar a essa constatação sem abrir um sorriso e agradecer a internet.
Talvez apenas pelo aumento das contas a pagar no fim do mês, que de longas, convenhamos, não deveriam ter nada.